“FOREST GUMP PRA MIM É MATO, PREFIRO CONTAR UMA HISTÓRIA REAL, PREFIRO CONTAR A MINHA. DARIA UM FILME...” - RACIONAIS MCs

Por César Augusto

“Uma boa educação começa em casa”. Se este velho refrão popular tem seu peso na formação de qualquer pessoa ,na minha, que sou filho único, ela acabou ganhando um valor ainda maior. Meu pai passou a maior parte da juventude trabalhando no campo, o máximo que ele conseguiu chegar em seus estudos foi até o fim do ensino fundamental, minha mãe quase não freqüentou a escola, chegando apenas à segunda série, no entanto, estes fatos nunca se transformaram em motivos para que, principalmente minha mãe, deixasse que eu me descuidasse dos estudos. Pelo contrário, mesmo não sabendo ler nem escrever, ela sempre fez questão de acompanhar de perto o meu desempenho na escola. Dona Maria sempre me dizia: “Meu filho, eu nunca pude estudar, mas com você vai ser diferente. Você não precisa trabalhar, só o que eu quero é que você estude, se forme naquilo que você quiser, que seja um homem de bem e que não se envolva com drogas e nem com nada errado. Não importa o tanto que eu tenha que me esforçar pra te sustentar até você terminar os seus estudos”. Para o orgulho de minha mãe eu me mantive até o fim do ensino fundamental sem tirar nenhuma nota vermelha em nenhuma prova se quer, porém, esse orgulho foi por água abaixo no final do primeiro semestre do ensino médio. Um AVC (popularmente conhecido como derrame) acometeu minha mãe nos meados de 1998, ela ficaria em estado semi-vegetativo para o resto da vida e eu sem o norte que guiava os meus estudos. Meu pai, que naquela época estava separado da minha mãe, voltou para casa para me ajudar, mas nem de longe conseguia suprir os cuidados dela com os meus estudos. Soma-se a isso um ano sem aula de Física, aulas de inglês que se limitaram ao verbo “to be” durante três anos, professores de Química que foram até o terceiro ano mostrando a diferença entre substâncias simples e compostas, além de um programa de educação continuada e o resultado não poderia ser outro; mesmo depois de um mar de notas vermelhas, de ficar de recuperação em cinco matérias e não aprender quase nada de útil durante três anos, consegui meu diploma de conclusão do ensino médio e um buraco na minha formação acadêmica. Contudo, justiça seja feita; durante esse período tive duas professoras, uma de História e outra de Português, que foram a luz no fim do túnel para mim. Graças a elas eu não passei pelo ensino médio totalmente alienado. Durante o ensino médio descobri, por influência de amigos, um gosto particular pela área do jornalismo. Tentei o único caminho que poderia me colocar numa faculdade naquele momento e fiz a prova da FUVEST. As 16 questões que eu acertei, das 80 do primeiro dia de prova, nada mais eram do que o reflexo do que eu disse até aqui. Nos anos seguintes o estudo ficou de lado e eu tive que sair atrás de trabalho para conseguir minha independência financeira e ajudar meu pai em casa. Fui vendedor ambulante, pizzaiolo e entregador de panfletos. Durante cinco anos não li sequer um livro. Meu dinheiro era suficiente para que eu comesse, bebesse e me divertisse, para mim aquilo era o suficiente. Nesse período, minha mãe faleceu e, por mais que eu não goste de admitir, isso acabou abrindo uma janela, já que eu tinha que conciliar o revezamento que eu e meu pai fazíamos para cuidar dela e o trabalho. Nessa trajetória uma conversa com um amigo, e por coincidência xará, mudaria o rumo da minha vida. Quando questionado por outro colega se eu não voltaria a estudar o outro César respondeu: “Ah, não adianta nada. Cê não vê o César (eu) aí. Todo mundo sabe que ele é inteligente, que gosta de estudar e tá aí que nem nóis”. Depois daquele dia prometi para mim que mudaria a minha trajetória. Aquelas palavras mexeram com o meu brio e serviram para eu enxergar algo que estava diante dos meus olhos e eu não via: quem poderia mudar a minha realidade era a minha força de vontade. Voltei a trabalhar em pizzaria, algo que eu tinha prometido que nunca mais faria. Durante quase dois anos procurei me estabilizar economicamente e decidi que voltaria a estudar. Em 2007 ouvi no rádio uma propaganda sobre um cursinho pré-vestibular sem fins lucrativos e com preços acessíveis. O cursinho da Poli foi outro divisor de águas na minha vida. Ali ,realmente eu tive professores que eram verdadeiros mestres e, sem fazer nenhum tipo de demagogia, digo que eles me mostraram muito mais do que um caminho para passar no vestibular. Durante os dois anos que eu estive lá, vi uma nova porta para a minha vida; voltei a ler, aprimorei minha escrita, aprendi a refletir sobre as coisas e não apenas aceitá-las sem antes questioná-las e tentar enxergar o máximo de perspectivas possíveis. Não consegui a tão sonhada vaga de jornalismo na USP e, para piorar, meu pai sofreu um derrame em janeiro desse ano que limitou seus movimentos e sua fala, dificultando ainda mais minha vida e a entrada em uma faculdade, nem por isso desisti. Através do PROUNI consegui entrar na PUC e hoje faço jornalismo numa conceituadíssima faculdade particular do Brasil, algo quase utópico se me dissessem que isso aconteceria . Continuo tendo que suar muito para conciliar meu trabalho de servente escolar em Itaquaquecetuba, meu outro trabalho de pizzaiolo aos sábados, os cuidados com o meu pai e acompanhar as aulas no mesmo nível dos alunos da minha sala que é infinitamente maior que o meu quando tinha a idade deles. Ainda assim, acho que estou me virando bem. Hoje olho para trás e prefiro esquecer os nomes de algumas pedras que dificultaram o meu caminho ate a Universidade, contudo, faço questão de mencionar aqueles que eu julgo serem os principais responsáveis por eu estar onde estou: Isaneide, Elênice, João Luíz e Inês do ensino fundamental. Georgina e Tamiko do ensino médio. Rafael, Thaís, Edson (Bilau), Márcio, Leão, Sérgio, Fábio, Futema, Claúdio, Fernando, Marcos, Xandão, Cris e Carol do cursinho. Sou grato a eles por me darem as ferramentas para chegar até aqui.

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